O Brasil pode estar se preparando para dar um passo inédito em sua política monetária e de reservas internacionais. Parlamentares e especialistas do setor econômico iniciaram, em abril de 2025, um debate sobre a criação de uma reserva estratégica nacional em Bitcoin.

Embora o governo ainda não tenha se posicionado oficialmente, o tema já movimenta gabinetes em Brasília, assessores do Banco Central e até representantes do Tesouro Nacional. A proposta é simples, mas poderosa: diversificar as reservas cambiais brasileiras utilizando um ativo escasso, descentralizado e globalmente reconhecido — o Bitcoin.
O que motivou o debate?
A pauta ganhou tração após a divulgação de um relatório técnico apresentado por um grupo de economistas independentes e parlamentares da Frente Parlamentar da Inovação. O documento sugere que o Brasil destine uma fração mínima de suas reservas internacionais (atualmente compostas majoritariamente por dólares e ouro) para compra programada de Bitcoin.
Além disso, o texto aponta a tendência de países como El Salvador e, mais recentemente, a Argentina, que já discutem a integração do BTC como instrumento de soberania monetária.
Outro gatilho para a discussão foi o avanço da inflação global, a instabilidade das moedas fiduciárias e a redução da confiança em reservas lastreadas unicamente em dívidas soberanas de grandes potências.
Por que criar uma reserva em Bitcoin?
Entre os argumentos a favor da medida estão:
- Escassez programada: o Bitcoin possui emissão limitada a 21 milhões de unidades, o que o torna resistente à inflação.
- Neutralidade política: por não ser controlado por nenhum Estado, o Bitcoin reduz a exposição geopolítica do Brasil.
- Liquidez global: o ativo pode ser convertido rapidamente em qualquer moeda ou usado como colateral internacional.
- Adoção crescente: países, empresas e fundos de investimento institucionais estão integrando o BTC em suas estratégias de longo prazo.
Portanto, os defensores da ideia acreditam que ter parte das reservas em Bitcoin funcionaria como proteção contra turbulências econômicas internacionais e contra o excesso de exposição ao dólar americano.
Quem apoia e quem resiste?
Dentro do Congresso, o projeto tem ganhado força especialmente entre parlamentares ligados à tecnologia e à inovação econômica. Deputados como Marcel van Hattem (NOVO-RS) e Kim Kataguiri (UNIÃO-SP) já se manifestaram positivamente sobre a proposta.
No entanto, setores mais conservadores da equipe econômica demonstram cautela. A ala tradicional do Banco Central, por exemplo, teme a volatilidade do ativo e o impacto diplomático de uma decisão simbólica como essa.
Ainda assim, mesmo entre os críticos, já se reconhece que o Bitcoin pode se tornar um ativo estratégico global — e que sair na frente pode representar uma vantagem histórica para o Brasil.
Propostas em andamento
Entre os principais projetos em discussão está o esboço de um “Programa Nacional de Ativos Digitais Estratégicos” (PRONADE), que incluiria:
- Alocação de até 2% das reservas internacionais em Bitcoin;
- Armazenamento seguro em custódia mista: parte com o Tesouro e parte com validadores independentes;
- Compra gradual por meio de mercados regulamentados;
- Relatórios semestrais de transparência para o Congresso e o TCU.
Além disso, o programa prevê a participação da sociedade civil e do setor privado na discussão sobre governança, custódia e auditoria do fundo.
E o que diz o Banco Central?
O Banco Central ainda não se posicionou oficialmente, mas fontes ligadas à autoridade monetária indicam que a instituição monitora com atenção o avanço da proposta. Internamente, alguns técnicos reconhecem que a diversificação das reservas “faz sentido” em um mundo onde os ativos digitais ganham protagonismo.
O presidente do BC, Roberto Campos Neto, já afirmou em diversas ocasiões que o Bitcoin “veio para ficar”. No entanto, ressalta que o Brasil ainda precisa avançar em segurança digital, infraestrutura e políticas de transparência antes de embarcar em uma estratégia oficial com ativos não soberanos.
Conclusão: um sinal de maturidade?
Seja aprovado ou não, o fato de o Brasil debater seriamente a criação de uma reserva em Bitcoin já é sinal de avanço institucional. Isso mostra que o ativo digital mais robusto do mundo saiu do gueto da especulação para entrar na pauta econômica de Estado.
O Brasil, que tem uma das populações mais engajadas em Bitcoin no mundo, pode finalmente alavancar esse protagonismo para se tornar pioneiro entre as grandes economias emergentes. E, nesse processo, garantir mais soberania, autonomia e estabilidade para seu sistema financeiro.